Olívia da Piedade Paranhos
Olívia repetia com gravetos os movimentos ágeis da avó com a linha no colo. Ainda criança fora proibida de manipular as agulhas de tricô pela severa matriarca, então se virava como podia para aprender sozinha. No futuro, não só dominaria aquela arte, mas também a do crochê - os biquinhos em panos de prato e toalhas foram sua marca registrada. Foi autodidata também na cozinha, olhando atentamente como sua avó procedia em frente ao fogão.
Órfã de mãe aos dois anos e criada pelo pai e pelos avós a menina teve poucas referências femininas naqueles tempos. Neste ambiente mais austero e fechado, cresceu também ela assim. Viviam próximos à estação de trem onde o pai, Maximiano, trabalhava como chefe. Ela se perdia na observação das composições e lá, próxima aos trilhos, conheceu José, bilheteiro.
Foram quatro filhos: Vera Lúcia, Ada Regina, Osvaldo Roberto e Odair. Mas o marido era muito boêmio e o casamento terminou, sobrando para Olívia a missão de criar as crianças com o apoio financeiro do seu pai. Crescidos, eles lembram dela como uma guerreira, que os criou com carinho sem deixar faltar nada. Ela mesma se via como uma galinha os levando embaixo da sua asa.
Sempre foi fechada, talvez até ocasionalmente fria, mas seus olhos se enchiam de lágrimas ao falar do orgulho dos filhos e dos seis netos - Natália, Kátia, Alexandre, Thaís, Marcelo, Rafael - e dos quatro bisnetos - Lorenzo, Alex, Fernanda, Felipe. Olívia foi amolecendo ao tornar-se avó e envelhecer, uma mãe com açúcar.
Gostava de frequentar a igreja e era devota de Nossa Senhora Aparecida e de Nossa Senhora de Fátima. Amava seu crochê e não passava sem café. E levava consigo o desejo confesso, mas não realizado, de conhecer Portugal, terra da sua família. Mais que tudo, porém, apreciava ver os seus juntos e em harmonia e como presente ganhou deles uma festa surpresa no seu aniversário de 90 anos, meses antes de sua partida.
Seus últimos 13 anos foram de altos e baixos na saúde depois de um infarto. Insuficiência renal e cardíaca, além de água no pulmão, somaram-se à diabetes. Internada no hospital recebia o mimo de um amigo enfermeiro: um pacote de café “contrabandeado” no bolso do jaleco. Olívia eventualmente partiu, na memória ficaram as suas peças de crochê e o cheiro do café.