Patricia Barbosa da Luz
Aos 16 Patrícia queria que seu aniversário fosse inesquecível. Focada, fez cartazes a mão e colou em postes do bairro inteiro com a data e o endereço. A festa para os amigos próximos subitamente se convertera em um evento grandioso, desses de rua fechada e gente dançando no asfalto. Sua família não entendeu nada, a comida não deu nem para o começo. Já ela olhou realizada para o seu feito. Queria todo mundo lá, até quem não conhecia, e conseguiu.
Vivera rodeada por amigos desde a infância feliz. Ampliados mas nunca perdidos, quem não era seu chegado provavelmente estava perto de ser. Ajudava nessa popularidade toda a paixão pelo brilho e pelo palco, ampliada na adolescência. Gostava de cantar, de dançar, de participar de eventos e de desfiles como modelo.
Se essas características a definiram, o surgimento da diabetes já aos 10 anos também marcou sua trajetória. As restrições, limitadas de início aos chocolates e doces com as amigas, ampliaram-se com a perda da visão. A partir de então, ficaria mais e mais clara a natureza especial do seu ser. Fez aulas de teatro, de canto, de dança e mesmo sem enxergar continuou nos palcos como gostava.
Apresentava-se com outros deficientes visuais no Teatro Cego, em peças encenadas na escuridão. Cantava em eventos e, vestida de palhaço, alegrava crianças doentes em hospitais. Distribuía alimentos para os moradores de rua, não permitia que a cegueira a limitasse.
Ainda como complicação da diabetes, seus rins adoeceram. Uma alternativa à hemodiálise, feita em casa, preservou as apresentações e o serviço social. Não seria mesmo tolhida dessa liberdade. À época já era formada em Nutrição, concluiu o curso antes de perder a visão. Depois dela fez pós-graduação para atuar na área médica, ajudando pessoas com problemas como os seus.
Patrícia acreditava firmemente na felicidade e em fazer a diferença na vida dos outros, principalmente pela solidariedade. Até curso de massagem colocou nessa conta. Preguiça era palavra desconhecida, ativava no seu entorno a vontade de agir, de ser útil. Sua força de vontade e ânimo viravam a senha e inspiração. Nas festinhas em casa era o ponto focal e quem tomava a frente na organização.
Lutou sozinha para conseguir os transplantes do rim e do pâncreas e recuperar um pouco da liberdade perdida. Rodeada de amigos, fazia o que gostava, de festas para dançar samba-rock a shows do Roupa Nova, banda favorita. Um dia, sentindo um desconforto no estômago, desistiu de ir a uma apresentação deles. Semanas depois era hospitalizada e, com a imunidade baixa por conta dos transplantes, não resistiu.
Seu velório foi um evento grandioso como fora em seus 41 anos de vida. Gente de todos os lugares, amigos da primeira infância até os últimos tempos. Para eles e para quem teve a existência tocada por sua presença, Patricia mostrou que vale a pena viver.