Manuella Vieira Ract Ramos
O último dia dos intensos e felizes 11 anos de Manuella neste mundo foi particularmente especial. Estava na casa da família em Ubatuba, seu lugar favorito e para onde sonhava em se mudar; comeu churrasco; fez selfie na piscina do condomínio e um raro post no Instagram; passeou com o pai de bicicleta. A vida até então fora sempre essa alegre sequência de experiências de descoberta, de conexão, de amor.
Adotada bebê com apenas um dia por Sandra e Fabricio, era a caçula e xodó dos irmãos Gabriel e Miguel e dos primos Julia e Pedro. Os padrinhos, Samyra e Flavio, desdobravam-se em cuidados quase como segundos pais, assim como os avós Maria e Iraí. A menina conhecia bem a sua própria história e cercada de afeto por todos os lados nunca se incomodara com ela.
Manuella viveu muito e viveu bem no curto tempo que lhe foi concedido por aqui. Foi duas vezes para Orlando, visitou Nova York, Grécia, Suíça, França, Portugal e Espanha, além dos muitos passeios pelo Brasil. Amava viajar e conhecer gente nova, seu jeito expansivo e falante era a porta de entrada, e tinha amigos de todas as idades. Como se consciente do próprio privilégio, fez questão de aproveitar a felicidade contida em cada momento, fosse onde fosse.
Há dois anos passou a fazer aulas de piano e já tocava algumas músicas. Como quando de surpresa interpretou a canção Além do Arco Íris, de Luiza Possi, para a madrinha Samyra no aniversário dela. Também fazia lições de dança, adorava sentir o corpo em movimento, especialmente no funk.
Na escola era na matemática que encontrava mais facilidade. Lá, uma escola de freiras, descobriu sozinha uma forte conexão com a espiritualidade. Fez primeira comunhão e retiro espiritual, o conhecimento teológico calava fundo dentro si. E nisso era diferente das outras pessoas da sua família, apesar da grande conexão que os unia.
Plena desse amor e passando os dias no lugar onde era mais feliz, Manuella foi chamada para jantar na casa de uma amiga de condomínio. Aos 11, chegava o momento de conhecer outros lares, de sair da proteção da sua própria casa. Neste dia não voltou, após um acidente na rede onde estava com a menina. Em pouco mais de uma década viveu mais e foi infinitamente mais feliz que muitos adultos e idosos. E deixou a sua marca nas pessoas de sorte de seu caminho.