Braz Barreis

 
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Quando perdeu a esposa, o amor de sua vida, Braz demonstrou ser realmente alguém capaz de ver o lado bom da vida. Maria de Lourdes, a Negrinha, fora para ele um anjo que deu direcionamento à sua vida e o colocou nos eixos, sempre com paciência e amor. Ele quando viu-se privado em definitivo da sua companhia baixou os olhos e na sequência afirmou “ela não merecia sofrer, era muito boa”. Foi essa mais uma reafirmação de uma das grandes lições deixadas para os seus. Partiria também duas semanas depois.

As histórias e travessuras vividas na infância em Portunduva, subdistrito de Jaú, foram contadas e recontadas nas noites de baralho com a família e com os amigos do bairro. Alegre, festeiro e bagunceiro desde então, roubava mangas e galinhas, e corria dos vizinhos. Chegou com os pais e os cinco irmãos a São Paulo quando tinha 10 anos, para morar no Ipiranga e depois na Vila Maria.

Lá conheceu Maria de Lourdes nos turnos de uma fábrica de algodão. Moravam próximos e daquele amor nascente veio o casamento e três filhas, Katia, Sueli e Celia. Depois da primeira gestação a mulher desenvolveu uma erisipela na perna, e coube a Braz olhar por todas e pela casa. Trabalhava na Blindex de madrugada e às manhãs saía para vender alho, queijo e chinelo na rua.

Sabia que não podia parar e, aposentado da empresa, comprou um bar no bairro. Ficava enquanto houvesse clientes, até às cinco da manhã se fosse preciso. Nada poderia faltar para a família. Também emprestava dinheiro a juros, sempre atrás de uma forma de fazer renda. Em meio a tanto trabalho, chegou a beber, fumar e até jogar e gastar . Endireitou-se no amor de Maria de Lourdes, sua neguinha; seria para sempre grato por isso.

Quando as netas nasceram - Luiza, Ana Beatriz e Manoela - as mimou o quanto pôde. Trazia frutas e verduras da feira e uma caixa de prestígio prontamente atacada pelas meninas. “Deixa as baianinha comer”, dizia aos risos sob os protestos dos pais. Para eles, perguntava sempre se precisavam de algo, sentia-se bem em ajudar. Sueli herdou dele o bar eventualmente, mas Braz seguia dando suporte por lá quando podia.

Com o dinheiro acumulado de tanto trabalho e a renda dos empréstimos que seguia fazendo comprou uma casa em Praia Grande. No seu bairro, em São Paulo, era conhecido como Latinha, sempre levando uma à mão para qualquer ida ao mercado ou à praça. Quando uma colite, inflamação no intestino, ficou pior, trocou a latinha por uma garrafinha de água, mas aí o apelido já tinha pegado.

Braz era tirador de sarro. Contava piadas em enterros e dizia que no dele não queria ninguém chorando, apenas seu caixão cheio de verdinhas e de latinhas. Sabia rir também de si mesmo. Quando perguntado se estava bem, respondia, galhofeiro: “Ah, tô bem não… Pedrão já tá mandando a corda”.

Um dia foi verdade. Com o pulmão comprometido por décadas aspirando pó de vidro na fábrica, sentia um cansaço incapacitante e não levantava da cama há anos. A chegada da Covid foi demais para o seu sistema. Braz partiu, mas deixou muito por aqui.

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